A “Crise de Autenticidade” no Marketing de Influência

Opinião de Sandra Miranda de Oliveira, Professora de Gestão Estratégica e Marketing. ISEG – Lisbon School of Economics & Management. Universidade de Lisboa.

Executive Digest
Outubro 29, 2025
9:48

Por Sandra Miranda de Oliveira, Professora de Gestão Estratégica e Marketing. ISEG – Lisbon School of Economics & Management. Universidade de Lisboa.

Nos últimos anos, as marcas têm vindo a investir de forma crescente no marketing de influência. Estima-se que a dimensão global desta indústria aumente de 19,8 mil milhões de dólares em 2024 para 31,2 mil milhões até 20271, refletindo a confiança cada vez maior das empresas nas parcerias com influenciadores digitais como uma estratégia eficaz para promover o envolvimento do público e impulsionar as vendas. Contudo, este crescimento enfrenta desafios significativos. A perceção pelos consumidores de falta de honestidade e transparência de alguns influenciadores tem alimentado o que muitos já designam por “crise de autenticidade” no marketing de influência. Os consumidores mostram-se cada vez mais céticos em relação a figuras que promovem produtos que não usam ou em que não acreditam verdadeiramente, ou que divulguem uma imagem pessoal idealizada e distante da realidade. Esta desconfiança coloca em causa a credibilidade das campanhas e sublinha a necessidade de relações mais genuínas e transparentes entre marcas, influenciadores e públicos.

Mas o que determina a perceção de autenticidade de um influenciador? O estudo recente de Duffek e colegas 2 mostra que a autenticidade não é um traço estável e intrínseco ao influenciador, mas sim o resultado contextual de cinco dimensões – competência, ligação emocional, integridade, originalidade e transparência– que adquirem importância variável conforme a perspetiva das marcas, das agências ou dos consumidores, e cujos desalinhamentos podem fragilizar a perceção de autenticidade do influenciador aos olhos dos seus seguidores.

Por exemplo, embora as marcas tendam a valorizar a competência formal dos influenciadores como fator de credibilidade, os consumidores apreciam sobretudo a autenticidade que nasce da experiência genuína e da transparência. Um exemplo disso é PewDiePie, que, mesmo sendo conhecido por jogos, reforçou a sua ligação com o público ao partilhar as suas experiências a conduzir pelo Japão com um Toyota, mostrando autenticidade fora do seu domínio habitual. Assim, os gestores devem valorizar a consistência do conteúdo, mas também encorajar influenciadores a explorar novas áreas, criando ligações mais orgânicas e verdadeiras com diferentes públicos.

Relativamente à ligação emocional, embora marcas e agências vejam a relação entre consumidores e influenciadores como parassocial e unidirecional, os próprios influenciadores percecionam a autenticidade como resultado de uma interação genuinamente recíproca. A autenticidade emerge quando existe envolvimento real — respostas a comentários, conversas diretas e criação de comunidades participativas. Assim, mais do que métricas superficiais de número de likes ou visualizações, o que realmente reforça a ligação entre influenciador e público é a profundidade e qualidade das interações. As marcas devem, portanto, valorizar influenciadores que cultivem conexões autênticas e transformem seguidores em comunidades envolvidas. A integridade é um dos maiores pontos de tensão.

A integridade diz respeito ao grau em que um influenciador é percebido como motivado por princípios genuínos, agindo com honestidade e transparência, sem intenções enganosas, e colocando sempre os interesses dos consumidores como prioridade central. A integridade nas parcerias entre marcas e influenciadores depende do alinhamento real entre os seus valores. Quando essa correspondência é fraca, a credibilidade e a autenticidade ficam comprometidas. No entanto, admitir abertamente o lado comercial das colaborações — sobretudo com humor ou autocrítica — pode, paradoxalmente, reforçar a confiança do público. Um exemplo é a campanha de Tyler, the Creator, que confessou usar uma marca de sapatos apenas porque foi pago para isso. Esta honestidade desarmante gerou empatia e aumentou o envolvimento do público. Este tipo de transparência humaniza o influenciador e torna a marca mais próxima. Assim, as marcas devem garantir uma sintonia de valores, incentivando os influenciadores a comunicar com honestidade, transformando a sinceridade em autenticidade percebida.

A originalidade também desempenha um papel essencial. Os desalinhamentos entre influenciadores e marcas muitas vezes surgem quando o estilo criativo e autêntico de storytelling do influenciador entra em conflito com o formato mais promocional desejado pela marca. No entanto, os consumidores respondem melhor quando o conteúdo mantém a voz original do influenciador e apresenta a marca de forma subtil e divertida. A integração de IA generativa não compromete essa originalidade, desde que o influenciador use a tecnologia com transparência e mantenha o seu estilo pessoal. Para preservar a autenticidade, as marcas devem definir objetivos claros, mas dar liberdade criativa, promovendo cocriação e respeito mútuo entre ambas as partes.

Por fim, a transparência emerge como condição moral e estratégica para sustentar a autenticidade nas parcerias entre marcas e influenciadores. Os consumidores esperam avaliações honestas que incluam tanto os pontos fortes como as fragilidades dos produtos, mas muitos influenciadores evitam fazê-lo por receio de perder futuras colaborações. As marcas, por sua vez, tendem a desincentivar este tipo de discurso temendo que as críticas comprometam a imagem do produto. No entanto, quando o feedback é equilibrado, a credibilidade do influenciador e da marca cresce. Incentivar comentários genuínos e criar diretrizes conjuntas que valorizem a transparência pode, a longo prazo, fortalecer relações e fidelizar o público.

Em suma, mais do que perseguir a perfeição, o futuro do marketing de influência passa por humanizar a comunicação substituindo o patrocínio oculto pela verdade emocional que os consumidores hoje reconhecem como o verdadeiro selo de autenticidade. O que o público procura é algo simples: reconhecer-se a si próprio do outro lado do ecrã.

1 HypeAuditor. (2025). State of Influencer Marketing 2025: Trends and Performance Metrics. https://hypeauditor.com/state-of-influencer-marketing-2025/

2 Duffek, B., Eisingerich, A. B., Merlo, O., & Lee, G. (2025). Authenticity in influencer marketing: How can influencers and brands work together to build and maintain influencer authenticity? Journal of Marketing, 89(5), 21-46. DOI: 10.1177/00222429251319786

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